Fontes legais de referência
O que configura um crime, como se dá a investigação preliminar, quais são os possíveis procedimentos penais são, portanto, algumas das perguntas que são respondidas de modo preciso e específico, com contínuas referências aos Códigos vigentes, ao Motu proprio Sacramentorum Sanctitatis Tutela de João Paulo II, de 2001 e atualizado por Bento XVI em 2010, e ao mais recente Motu proprio Vos estis lux mundi, publicado em 2019 pelo Papa Francisco. Ademais, em alguns casos se especificam as diferenças entre o Código dos Cânones para as Igrejas Orientais e o Código de Direito Canônico para a Igreja Latina: por exemplo, na condução de um processo penal extrajudicial – ou seja, administrativo, que reduz as formalidades processuais para acelerar a justiça, mas mantém intactas as mesmas garantias – a Igreja latina não prevê a presença de um Promotor de Justiça, enquanto para as Igrejas orientais é obrigatório.
Acolher, ouvir e acompanhar a vítima
O Vade-mécum apresenta quatro necessidades, em particular: em primeiro lugar, a tutela da pessoa humana. Pede-se às autoridades que se “comprometam a fim de que a suposta vítima e a sua família sejam tratadas com dignidade e respeito”. É preciso oferecer-lhes “acolhimento, escuta e acompanhamento, inclusive através de serviços específicos, bem como assistência espiritual, médica e psicológica, de acordo com o caso específico”. “Igualmente pode ser feito em relação ao acusado”, ressalta o manual. Além disso, se recorda a importância de tutelar “a boa reputação das pessoas envolvidas”, mesmo se, em caso de perigo para o bem comum, se enfatiza que difundir notícias sobre a existência de uma acusação não representa a violação da boa reputação.
Direitos do acusado
Verificação cuidadosa de toda e qualquer informação
Um segundo aspecto que emerge do Vade-mécum é a exigência de verificação escrupulosa e cuidadosa de toda e qualquer informação recebida por um ordinário sobre um presumível caso de abuso. Mesmo se não houve denúncia formal, mesmo se a notícia foi difundida pelos meios de comunicação, incluindo as redes sociais, mesmo se a fonte é anônima, o documento sugere avaliar atentamente toda informação recebida e aprofundá-la. Naturalmente, o sigilo sacramental permanece válido: nesse caso, o confessor deverá convencer o penitente a dar, por outros caminhos, conhecimento do suposto abuso.
Sigilo de ofício e anúncios públicos
O terceiro aspecto diz respeito à comunicação: em vários pontos do Vade-mécum se recorda a obrigação de respeitar “o sigilo de ofício”, embora se ressalte que, durante a investigação prévia, a suposta vítima e as testemunhas não têm “o vínculo do silêncio em relação aos fatos”. Em todo caso, solicita-se evitar toda “inoportuna e ilegal” difusão de informações ao público, sobretudo na fase da investigação preliminar, para não dar a impressão de já ter definido os fatos. Ao mesmo tempo, explica-se que, se houver uma apreensão judicial ou uma ordem de entrega dos documentos pelas autoridades civis, a Igreja não pode mais garantir a confidencialidade da documentação adquirida. Um parágrafo se detém, em seguida, sobre comunicados públicos que devem ser feitos durante uma investigação preliminar: nesses casos, recomenda-se cautela e uso de formas “essenciais e concisas”, sem “anúncios retumbantes”, porque desse modo se acabaria antecipando o julgamento sobre os fatos.
Evitar transferências dos clérigos envolvidos
Por fim, destacam-se outras indicações particulares. A primeira diz respeito às medidas cautelares: elas não são uma penalidade, mas um ato administrativo que pode ser imposto desde o início de uma investigação preliminar para proteger a boa reputação das pessoas envolvidas e o bem público, ou para evitar o escândalo, a ocultação das provas ou possíveis ameaças à suposta vítima. Não mais subsistindo as causas para as mesmas ou concluído o processo, as medidas cautelares podem ser revogadas, mas ao fazê-lo se recomenda “prudência e discernimento”. A segunda indicação concerne ao uso da terminologia “suspensão a divinis” para indicar a proibição de exercício do ministério imposta como medida cautelar a um clérigo: o Vade-mécum sugere “evitar essa denominação” em fase de investigação preliminar, porque se trata de uma penalidade que em tal fase “ainda não pode ser imposta”. Em vez disso, se use o termo “interdição ou proibição” de um exercício do ministério. Durante a investigação preliminar é solicitado que sempre se evite a transferência do clérigo envolvido.
fonte: Vatican News